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Ver Versão Completa : Sou um sobrevivente !



João Tadeu Boccoli
02-06-06, 20:04
Minha primeira experiência com veículos de duas rodas teve meu tio Oswaldo como o grande louco da família, que me botava em pé, entre o guidão e o banco de sua Lambretta, lá pelos meus 6 anos de idade.
Aprendi a guiar moto mais olhando que praticando, até que um dia, conversando com meu pai no portão de casa, pára o meu amigo Penteado com sua novíssima Honda CB 50 SS, e eu com a maior cara de pau perguntei se ele deixaria que desse uma volta no quarteirão.
Campanha muita bem feita, pois tal foi à surpresa de meu pai em me ver rodando de moto, que alguns meses após fui presenteado com uma Honda CB 125 dourada, de 2 cilindros e partida elétrica, zero bala. Fiquei muito bonito na fita ...
Assim começa em 1974, a minha vida como motociclista.
Naquela época, moto ainda era uma coisa muito restrita, e moto de grande cilindrada era pra gente de muita grana; daí dá para se imaginar que os demais acessórios, como capacetes, casacos, luvas, etc. eram itens de difícil compra.
Já sou sobrevivente por ter passado pelas insanidades de Lambretta com meu tio, mas resgatando minhas memórias do passado, e de maneira bem rápida, cito sobre a minha adolescência :

Não era obrigatório o uso de capacete ... dá pra acreditar ?
Não usávamos roupa de couro.
Moto com freio a disco só nas figurinhas, ou nas motos muito caras. Vale lembrar que ver uma 750cc na rua era muito difícil.
Andávamos no verão, na moto, de calção, sandália de dedo, e sem camisa.
Não existiam celulares, e nossas mães viviam com o coração na boca.
As namoradinhas eram proibidas de andar de moto com a ´juventude transviada’.
Andávamos em grupo por puro prazer, em forma de bando mesmo.
Não existia a profissão de moto-boy, e pasmem, os carros não nos respeitavam do mesmo jeito.
Não existia atendimento do corpo de bombeiros como hoje, e as vitimas eram carregadas de qualquer modo para algum hospital, ou por táxi ou pelo carro de alguma boa alma presente na hora. Não esqueça que não existiam celulares, telefones eram coisas raras, e chamar alguém da família era simplesmente impossível.
Não existia o CET que temos hoje, em 1974 tínhamos uma corporação o então DSV, que a população chamava carinhosamente de BEM-TE-VI por causa dos apitos, e eles tinham acabado de receber um lote de Suzuki 350T, com os comandantes de 500T. Eram bons policiais, mas péssimos motociclistas, graças a Deus. Pois a maioria dos motociclistas não tinha habilitação e eu, em particular, era menor de idade ... meu pai foi um louco!
Furar o pneu na noite de sábado era sinal de empurrar a moto até em casa, desmontar a roda pela manhã, e ficar procurando um maldito borracheiro aberto aos domingos.
Bateu, caiu, amassou eram sinônimo de meses sem moto pois tudo era importado e levava o maior tempo até chegar. Dá também pra imaginar como era na hora de se ter que comprar pneus novos.

Enfim, um misto de insanidade e romantismo, de brutalidade grupal e amor fraterno ... uma boa época.

Saiamos diariamente, na hora do lanche do Colégio de São Bento e corríamos até a ‘Esquina do Barulho’ no centro antigo, só para poder ver as motos na loja do Sr. Edgar Soares, as grandes maquinas européias na loja do seu Latorre, entre outras.

No domingão, íamos ao parque do Ibirapuera (naquela época era aberto ao transito) sob a marquise, ter com Adú Celso, Jacaré, Tche q Tche, e outros corredores profissionais que transmitiam, a nos, seus admiradores, o modo esportivo de se pilotar. Belos tempos, belos dias ...

Hoje, assíduo participante do PN, fico lendo sobre uma ou outra moto, qual que anda mais ou menos, qual que tem a linha mais atual, quais serão os futuros lançamentos, quem faz as melhores manobras; e fico achando que quase tudo está igual, pelo menos na óptica das diferenças interpessoais.

Sim, sou um sobrevivente, e agradeço a Deus em poder estar vivo ( sim, perdemos vários e bons amigos ), e vendo o ponto que a tecnologia, que a ciência, que o amadurecimento da humanidade, e o ponto em que motociclismo se encontra.

Parabéns a todos vocês, e espero encontra-los e tê-los no rol da eternidade como sobreviventes também ...

casali
02-06-06, 21:04
nossa isso realmente é amor ao motociclismo

geralmente não leio os textos extensos, mas realmente prestarei mais atençao em seus textos

parabens e suscesso coma sua coluna moto online

Cabra de Brasília
02-06-06, 21:22
Eu não consigo me ver dirigindo um carro( se algum dia vier a ter de dirigir um vai ser por extrema necessidade).....digo para as pessoas que prefiro uma CG 150 a qualquer carro.... elas acham que estou falando besteira.....quando você ama uma coisa é muito louco.........Parabéns Tio.........

Ramiro
02-06-06, 21:24
:tchauu: Que linda história!!

web100
02-06-06, 21:45
Legal ter essas histórias pra contar! Continue pilotando...

João Tadeu Boccoli
02-06-06, 23:16
nossa isso realmente é amor ao motociclismo

geralmente não leio os textos extensos, mas realmente prestarei mais atençao em seus textos

parabens e suscesso coma sua coluna moto online

Muito obrigado pelas palavras, e espero estar de alguma maneira contribuindo para o crescimento pessoal de todos nós ... :D

João Tadeu Boccoli
02-06-06, 23:33
Eu não consigo me ver dirigindo um carro( se algum dia vier a ter de dirigir um vai ser por extrema necessidade).....digo para as pessoas que prefiro uma CG 150 a qualquer carro.... elas acham que estou falando besteira.....quando você ama uma coisa é muito louco.........Parabéns Tio.........

Amar é o grande segredo no 'se ter', alem que tambem se é importante o acreditar ... e eu acho que é isso que define a realização de um sonho.

Obrigado sobrinho !

João Tadeu Boccoli
02-06-06, 23:38
Ramiro, ela ainda não chegou ao fim ... ainda estou sobrevivendo !

web100, como é bom ter o que contar, melhor ter com quem dividir, e o ideal tambem é ouvir ... vou esperar para escutar as suas historias.

Cabra de Brasília
02-06-06, 23:41
Eu ficava muito triste,triste mesmo..... quando dizia para as pessoas que prefiro uma CG a qualquer carro....e elas ficavam caçoando de minha cara.....por fim parei de falar.......

m4teus
03-06-06, 00:31
João Tadeu Boccoli, parabéns pela sua narrativa, li com bastante atenção, pois já ouvi histórias assim de "macacos velhos", já com seus 50 anos ou mais.. e acho interessante.

Alias, você lembra de alguma Yamaha da década de 80, de 50cc do estilo cross? Se lembrar do nome do modelo eu ficaria feliz.. meu pai fica comentando que essa foi a primeira moto dele, "uma cinquentinha cross da yamaha". E eu fiquei procurando fotos da danada, mas não tive sucesso :(

Meu pai, como alguns colegas do tempo dele, também andavam pra cima e pra baixo em bando.. juntavam uns 20 motociclistas da cidade e ficavam passeando por ai..

Abraço, t+!

João Tadeu Boccoli
03-06-06, 01:13
João Tadeu Boccoli, ... Yamaha da década de 80, de 50cc do estilo cross? Se lembrar do nome do modelo eu ficaria feliz.. meu pai fica comentando que essa foi a primeira moto dele, "uma cinquentinha cross da yamaha". E eu fiquei procurando fotos da danada, mas não tive sucesso :( ... Abraço, t+!

Bem, obrigado pelas palavras.
Como o seu pai pode lembrar, tivemos a proibição de importação entre 1976 a 1990/1.
A grande maioria das motos eram importadas, e foi nessa época que a primeira fabrica de motos se instalou no Brasil, a YAMAHA.
Os produtos de 50 cc da Yamaha eram tipo STREET o que me leva a crer que o senhor seu pai teve um dos modelos que coloco abaixo :

m4teus
03-06-06, 01:27
João Tadeu Boccoli, muito obrigado! acabei de mostrar as fotos para ele!

Mas conversando agora com ele, conclui que eu me confundi um pouco: realmente a primeira moto dele foi uma 50cc STREET da yamaha, o modelo Cross veio depois, uma 1972 125CC Cross importada do Japão e amarela :D

Desculpe pela confusão de categoria e cilindrada, e eu e meu velho agradecemos pelas fotos! :)

João Tadeu Boccoli
03-06-06, 01:36
m4teus, sem problemas ! Fica abaixo mais uma referencia fotografica !

cacamba
03-06-06, 09:15
É valeu....
Continue contando as suas experiencias para os mais novos....
Asssim engrandece o meio motociclistico......

Rafael Backes
03-06-06, 09:29
Gostei do texto, bem escrito. Mas acredito que naquela época motociclistas eram mais felizes e mais LIVRES que hoje, por isso tenho uma certa inveja nesse ponto.